Se o boxe um esporte novo para as mulheres nos Jogos Olmpicos (entrou a partir de Londres-2012), na vida da baiana Beatriz Ferreira, 26, ele se fez presente desde muito cedo. "No lembro de ter comeado no boxe, j nasci naquele meio. Sempre gostei de ver o meu pai treinando e competindo. Sou a f nmero um dele e peguei esse amor para mim. herana de famlia", afirmou a atleta Folha no ltimo dia 16, quando se preparava para os Jogos Pan-Americanos de Lima.
Ela far a estreia no evento neste domingo (28), a partir das 18h (de Braslia). O pai da boxeadora Raimundo Ferreira, conhecido como Sergipe e que foi sparring do ex-campeo mundial Acelino Pop Freitas. Em sua casa no bairro Nova Braslia, periferia de Salvador, ele tinha uma academia improvisada na garagem, onde treinavam alguns jovens. Bia cresceu nesse meio, sonhando com o dia em que chegaria a sua vez. Mas demorou.
"Na Bahia, se voc no faz capoeira, voc faz boxe, no tem outra opo [risos]. Todo mundo l tem muitos projetos sociais, ento junta um bolinho de crianas e j comeam a treinar", ela disse.
Quem a v hoje como a responsvel pela principal chance de medalha do boxe brasileiro nos Jogos Pan-Americanos e na Olimpada de Tquio-2020 pode no imaginar quantas vezes a atleta teve que esperar por esse momento.
Bia comeou a treinar cedo, mas demorou para participar de competies. O entrave era a inexistncia de eventos de boxe para mulheres em Juiz de Fora, para onde ela havia se mudado com o pai aos 13 anos.
Quando enfim conseguiu entrar num torneio nacional, em 2014, venceu na estreia, mas acabou desclassificada na sequncia. O motivo: j havia participado de um evento de muay thai, e as regras da Aiba (Associao Internacional de Boxe) na poca impediam que um pugilista tivesse experincia em competies de outra arte marcial.
A baiana, que esperava finalmente iniciar sua carreira como pugilista, teve que esperar dois anos at ser autorizada a competir novamente.
Como j despertava a ateno da Confederao Brasileira de Boxe, ela logo foi convidada a participar do projeto Vivncia Olmpica, iniciativa do Comit Olmpico do Brasil durante a Rio-2016 para que jovens talentos tivessem contato com o mais alto nvel de suas modalidades.
Bia tornou-se sparring de Adriana Arajo, 37, tambm baiana e que havia sido medalhista de bronze em Londres-2012 na mesma categoria (60 kg). A conquista e a proximidade com sua referncia no esporte fizeram a mais jovem acreditar que poderia repetir o feito. Com a agem de Adriana para o boxe profissional, Bia tornou-se a principal aposta na modalidade.
Se antes faltavam oportunidades para competir, hoje ela tem um currculo internacional extenso (bem maior que seu cartel nacional, inclusive). Patrocinada pela Petrobras, tambm integra o programa de atletas de alto rendimento da Marinha e recebe o bolsa atleta na categoria pdio, a mais alta do projeto.
Apesar de contar com o apoio de seis treinadores na seleo brasileira, ela no deixa de ouvir o que diz o primeiro e ainda mais importante de todos: seu pai. "Ele ainda meu porto seguro, porque me conhece desde sempre e sabe do que eu preciso. Sempre tiro dvidas com ele", afirmou.
O bom momento da sua carreira coincide com a expanso do boxe feminino na Olimpada, que ter duas categorias a mais nos Jogos de Tquio-2020 em comparao s outras duas edies em que esteve presente. No ano que vem sero oito eventos masculinos e cinco femininos.
O Pan de Lima funcionar como teste para o objetivo maior de Bia, daqui a um ano, no Japo. A principal rival da baiana no Peru dever ser a americana Rashida Ellis, nica das adversrias da chave sobre quem ela no leva vantagem nos confrontos diretos (empate em 1 a 1).
A final da categoria 60 kg est marcada para o dia 2 de agosto. Por ora, subir ao pdio para ouvir o hino brasileiro a nica coisa que a pela cabea da pugilista, que sempre carrega a bandeira nacional na cabea em forma de uma bandana.
"Eu queria ser diferente e precisava ter uma marca. J tenho o brao todo tatuado, mas queria um toque a mais. A comecei a usar a bandana para subir no ringue e ficou. A galera olha e j reconhece a menina da bandana", explicou a pugilista.
Direto de So Paulo, Daniel E. de Castro, Folhapress